é vida; liberdade e fantasia; erguer o cajado da equidade num campo turbulento; a musa oculta na orla do riso; caminho obscuro no vórtice da memória;
CLAUSURA
A tua garça não esvoaça agora sobre o resto da margem sul, anda sofrida entre o campo e o campo, o tempo e o tempo. A ave libertária dos sonhos joviais anda presa ao feitiço da idade que pesa, dos trilhos não abertos no alvorecer. Já não falas da justeza das coisas aos famintos na calçada, da insensível geração de luta para com os seus correligionários da mata. Hoje, do alto da montanha, olhas o fim dos tempos encostado a um varal de roupas cansadas do tronco nu. Onde encontrar a razão do atrofiamento das asas?
BAGAGEIRA
No My Love o medo encolhe a palavra, ergue nos declives da mata o símbolo; infantil, brinca solitário nos alvéolos da trepadeira, incha os bolsos furtados pelo vazio e os rebuçados rebolam na ingenuidade da língua.
A memória ri da sorte, gagueja ardentemente pelos amores esquecidos na janela do tempo, o sol é verde e dança na cortina da vida. Tudo é onda, o milagre esconde-se na fornalha, os calços da bagageira abrem os pés ao infinito.
Constroem-se sonhos no regresso à casa, ao mutismo dos corpos arredonda-se o cansaço da noite, o sol é verde, as andorinhas fintam a poeira da tarde, cintilam do alto às palpitações do coração.
A palavra desvenda montes, as cores atadas ao corpo ofuscam o prazer do silêncio, o pneu sobressalente aconchega vontades no interior, a bagageira oscila entre o fim e o medo.
23.05.17
14:26
In: Descrição das Sombras, FFLC, 2016
1.
Não dei nomes às coisas; uma palavra é um sopro,
um casquilho enfurecido nas telas de Quehá.
2.
Um pássaro amarelo amortece o vício, como não
domino o peso da harmonia, entoo música suada nos
pincéis nocturnos; cheiro a terra ensanguentada.
3.
Fios de cabelo, recortes de jornal, forjam o volume
das cores, abro o tecido do corpo, meus calções tingem o lugar da sede dentro de mim.
4.
Não há vanguarda em cada esquina, uma geração
esmorece nas cores do níquel, pendura o sonho nos
degraus absortos da manhã.
5.
Uma pirueta é mais densa que a água do pátio;
In: Aroma Fóssil, Gala-Gala edições, 2022.
Biografia
M.P.Bonde nasceu em Maputo. Foi membro do Projecto Jovens e amigos da cultura (JOAC) e do Colectivo Arrabenta Xithokozelo. Lançou a sua primeira obra literária Ensaios Poéticos, pela Cavalo do Mar em 2017. No mesmo ano foi vencedor da 1a edição do Prémio Literário Fernando Leite Couto, na modalidade de Poesia com a obra Descrição das Sombras. Obteve o 2o lugar 14º Prémio Escriba de Poesia 2018, Município de Piracicaba, São Paulo, Brasil com texto: Sugar a tempestade da infância. Em 2022 lançou Aroma Fóssil sob chancela da Gala-Gala Edições. Colabora com a revista nacionais e estrangeiras, e tem textos publicados em jornais, revistas electrónicas e blogs. É membro da Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO).